Jovem Engels: dialética e crítica da economia política

 

Felipe Cotrim (PPGHE/USP)

 

Introdução

A seguinte comunicação visa apresentar de forma sintetizada a contribuição do jovem Engels na formulação da crítica da economia política. Esta síntese será realizada a partir do exame parcial do ensaio Esboço de uma crítica da economia política (Umrisse zu einer Kritik der Nationalökonomie), redigido entre o final de 1843 e janeiro de 1844, e publicado nos Anais Franco-Alemães1 em 1844. Engels tinha por objetivo no Esboço de 1844 iniciar e impulsionar um programa de investigação e revisão crítica dos pressupostos e das categorias fundamentais da economia política clássica (por exemplo, riqueza, valor, propriedade privada, concorrência-monopólio, capital-trabalho etc.). (ENGELS, 1981; MECW 3, 1975, p. 418–443; MEW 1, 1981, p. 499–524)⁠

O Esboço de 1844 fora o primeiro texto de Engels sobre economia e teve recepção positiva entre seus contemporâneos e, posteriormente, entre marxólogos que reconheceram os méritos de Engels como pioneiro da crítica da economia política. (MARX, 2008b, p. 48–49, 2010; MECW 3, 1975, p. 615; NETTO, 1981, p. 33–34, 2010, p. 27–30; SECCO, 1996)⁠

A despeito de suas debilidades (reconhecidas posteriormente pelo próprio Engels, que afirmou em carta a Wilhelm Liebknecht2 que este ensaio de juventude encontra-se repleto de inexatidões, obsoleto e que dispunha de, no máximo, valor histórico), deve-se reconhecer alguns de seus méritos. O ensaio tratou-se da “primeira análise das categorias constitutivas da economia política operada a partir de uma perspectiva dialética e comunista”, (NETTO, 2010, p. 27)⁠ ou seja, a partir da perspectiva da classe trabalhadora, superando, desta forma, os limites da crítica do capitalismo dos socialistas utópicos e ricardianos, por exemplo, Robert Owen (1771-1858) e Thomas Hodgskin (1787-1869). Expõe, também, o desenvolvimento teórico de Engels após um período aproximado de um ano de trabalho e pesquisa na Inglaterra3 e seus avanços na compreensão dos fundamentos do capitalismo e da sociabilidade burguesa a partir de sua formação histórica. (NETTO, 1981, p. 33–34, 2010)⁠

Neste Esboço de 1844, Engels dissertou sobre uma série de temas relativos a economia política, por exemplo, a crítica (incipiente) do valor, da propriedade privada burguesa, da teoria da superpopulação de Thomas Malthus (1766-1834) etc. Porém, a fim de tornar esta comunicação viável, deixaremos de lado estes temas (por mais relevantes que estes sejam para aqueles que se dedicam a pesquisa da história do pensamento econômico)4 e voltaremos nossa atenção para aquele que, acreditamos, tenha sido a contribuição mais duradoura do Esboço de 1844: a introdução da dialética no exame das categorias econômicas e das relações sociais econômicas.5 6

Para tanto, organizamos nossa comunicação em duas partes.

Na primeira parte apresentaremos o pressuposto metodológico de Engels em sua investigação e exposição dos clássicos da economia política e das relações sociais econômicas: a dialética materialista de Feuerbach.

Na segunda parte realizaremos a exposição, através de alguns exemplos selecionados, do exame engelsiano das categorias econômicas no Esboço de 1844.

1. Dialética materialista: a revolução teórica de Feuerbach

Conforme comentamos acima, o Esboço de 1844 consistiu no primeiro texto no qual a economia política, assim como as relações sociais econômicas, foram examinadas a partir de uma perspectiva dialética.

Engels iniciou sua instrução na concepção dialética de mundo durante os anos nos quais morou na cidade alemã de Bremen (c. 1838-1841) através do estudo da filosofia clássica alemã, particularmente as obras Fenomenologia do Espírito (Phänomenologie des Geistes, 1807), Ciência da Lógica (Wissenschaft der Logik, 1812-1816) e Enciclopédia das ciências filosóficas (Enzyklopädie der philosophischen Wissenschaften, 1817-1830) do filósofo alemão G. W. F. Hegel (1770-1831). Sustentado na dialética hegeliana, Engels apresentou formulações interessantes sobre sua concepção de história, por exemplo, no ensaio Sinais retrógrados do tempo,7 definiu a história como “uma espiral desenhada à mão livre, cujas voltas não são executadas com muita precisão”, e concluiu, mais adiante, “quem pode prever qual será o fim [desta]?” (MECW 2, 1975, p. 48; MEW 41, 1967, p. 27)⁠. Esta breve citação demonstra ao leitor que Engels, desde sua juventude, considerava a história como sendo um processo aberto, não pré-determinado e sem qualquer tipo de teleologia.

Engels prosseguiu seus estudos de filosofia em Berlim, onde morou durante os anos de 1841-1842 e frequentou conferências na Universidade de Berlim e integrou os ciclos dos intelectuais da cidade. Neste período tomou conhecimento da obra do filósofo e teólogo alemão Ludwig Feuerbach (1804-1872), cujo livro A essência do cristianismo (Das Wesen des Christentums, 1841) marcou profundamente Engels.

Feuerbach expõe sua crítica da religião tendo como fundamento metodológico a teoria da alienação derivada de Hegel e a, então, inovadora concepção materialista da dialética, meio pelo qual estabelece a consciência humana com centro de toda criação material ou espiritual, isto é, subjetiva. (FEUERBACH, 2007)⁠

Fundamental para nossa exposição fora o caráter inovador de Feuerbach perante a dialética hegeliana, transpondo-a do idealismo para o materialismo. Esta nova abordagem dialética (o materialismo feuerbachiano), como também a teoria feuerbachina da alienação religiosa, desenvolvidas e demonstradas ao longo de A essência do cristianismo serviram de modelos metodológicos para que Engels examinasse as categorias econômicas fundamentais da economia política clássica. Fora, precisamente, estas abordagens metodológicas que garantiram ao Esboço de 1844 o status de ensaio pioneiro no estudo da anatomia da sociedade burguesa e da crítica da economia política. (ENGELS, 1981, p. 64)⁠

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Divergindo efetivamente dos economistas políticos clássicos britânicos e franceses, que examinavam seu objeto de investigação (as relações sociais econômicas) a partir de um materialismo mecanicista, no qual as categorias econômicas eram apreendidas de maneira isolada, petrificada e ausente de mediações, a dialética materialista utilizada por Engels examina seu objeto de investigação como sendo fruto de um processo histórico em constante movimento e transformação. (ENGELS, 2015, p. 53)⁠8 9

O método utilizado por Engels, contudo, não se tratou de uma aplicação mecânica da dialética materialista feuerbachiana exposta em sua crítica da alienação religiosa no livro A essência do cristianismo. A crítica da economia política iniciada por Engels consistiu em um desenvolvimento e avanço substancial em relação a primeira. A alienação religiosa criticada por Feuerbach tem como limite o nível da consciência, isto é, da subjetividade humana, sendo, portanto, parcial. Por sua vez, a crítica da alienação econômica vai a raiz da questão, pois, examina a vida efetiva dos sujeitos, isto é, a sua vida social e material, portanto, detêm caráter universal. (MÉSZÁROS, 2006)⁠

Tendo como referencial metodológico o a dialética materialista, Engels inicia sua crítica das categorias constitutivas da economia política de forma similar a Feuerbach em sua crítica da teoria da alienação religiosa: “na economia, […] tudo é colocado de cabeça para baixo: o valor que é, à partida, a fonte do preço, é situado na dependência do seu próprio produto. Esta inversão, sabe-se, é a essência da abstração.” (ENGELS, 1981, p. 63-64). Esta inversão entre aparência-essência, ideal-material etc., praticada pelos economistas políticos clássicos seria o ponto de partida da crítica engelsiana da economia burguesa, como também, da alienação econômica.10

2. O exame dialético das categorias econômicas

A seguir realizaremos a exposição, a partir de alguns exemplos selecionados, da forma pela qual Engels examinou de forma dialética as categorias fundamentais da economia política.

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O primeiro exemplo trata-se do exame engelsiano das categorias lutas de classes-propriedade privada.

Para Engels, estas duas categorias não podem ser examinadas de forma independente, pois existe uma estreita relação entre o surgimento da propriedade privada e a divisão social em classes, isto é, entre aqueles que detêm o domínio sob a propriedade e aqueles que são excluídos desta. Portanto, tratam-se de categorias que historicamente emergem e desenvolvem-se como que simultaneamente.11 Conforme Engels, esta relação lutas de classes-propriedade privada somente poderá ser suprassumida (aufgehoben)12 com o fim da propriedade privada.

Assim como o economista político inglês David Ricardo (1772-1823), Engels observou a sociedade burguesa a partir da divisão em três classes fundamentais: proprietário fundiário, o capitalista, e o proletário. A partir desta divisão, Engels nota que as duas primeiras classes, proprietário fundiário (renda) e capitalista (lucro), unidas, compõem o capital. Por sua vez, do outro lado, o proletário (salário) compõe o trabalho. Desta forma, Engels concluiu que proprietário fundiário e capitalista constituem um só classe contra o proletário, ou seja, identifica a luta fundamental da sociedade burguesa, a luta entre o capital versus o trabalho.

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O exemplo seguinte trata da aparente contradição entre concorrência-monopólio.

Herdeiro da filosofia clássica alemã, Engels formulava suas reflexões sempre tendo em conta a unidade dos contrários, isto é, a partir de categorias reflexivas, que a primeira vista aparentam oposição, contudo, na atividade concreta impulsionam uma a outra, sendo, assim, interdependentes. A exposição engelsiana a respeito da concorrência-monopólio é exemplar de seu tratamento dialético perante as categorias econômicas.

Sobre a relação concorrência-monopólio, Engels comentou:

“É fácil compreender que este antagonismo {concorrência-monopólio} é também absolutamente vazio. Quem quer que entre no jogo da concorrência deve desejar o monopólio, seja trabalhador, capitalista ou proprietário fundiário. Qualquer pequeno grupo de concorrentes deve desejar assegurar um monopólio contra todos os outros. A concorrência assenta no lucro e o lucro origina, em troca, o monopólio; em breve, a concorrência se transforma em monopólio. Por outro lado, o monopólio não pode conter a corrente da concorrência; pelo contrário, ele mesmo suscita a concorrência […]” (ENGELS, 1981, p. 69)

Uma resolução simples, mas que ainda gera cansativos e infecundos debates. Quebra-se, assim, o encanto dos benefícios da concorrência capitalista difundida tanto pelos economistas políticos clássicos quanto pelos economistas contemporâneos.

O monopólio não consiste em um antagonista da concorrência, tanto quanto a concorrência não serve de antídoto para o monopólio. Pelo contrário, a concorrência é seguida pela formação dos monopólios, Por sua vez, os monopólios fomentam uma concorrência ainda mais feroz que a precedente, pois, então, a concorrência é feita não mais entre pequenos a médios capitalistas, mas entre verdadeiros gigantes disputando o butim da riqueza socialmente produzida.

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De modo similar a crítica da concorrência-monopólio, Engels também tratou do falso equilíbrio entre oferta-demanda, ironizando a máxima de economistas políticos, por exemplo, Say, de que “nunca se pode produzir demais”, pois a oferta criaria sua própria demanda.

Através de seus estudos sobre a história econômica e social da Inglaterra, como também de sua experiência prática em Manchester, Engels observou que as crises comerciais capitalistas “aparecem tão regularmente como os cometas e de tal modo que, hoje, temos uma, em média, a cada cinco ou sete anos. Tais crises produzem-se há vinte anos com a mesma regularidade que as grandes epidemias de outrora, e trouxeram mais miséria e imoralidade que elas”. (ENGELS, 1981, p. 70)⁠ Esta passagem não somente demonstra o ceticismo de Engels perante a possibilidade de haver uma economia capitalista estável e não suscetível a crises periódicas, como também é o ponto de partida da questão que será examinada futuramente e com maior rigor por Marx em O capital (1867, 1885, 1894): a teoria das crises do capital.

Considerações finais

Buscamos demonstrar nas linhas acima o papel pioneiro de Engels no exame dialético das categorias econômicas.

Justamente por seu caráter pioneiro não se deve esperar que este fosse capaz de oferecer ao leitor respostas satisfatórias a todos os aspectos das novas e complexas questões deste novo campo de investigação, a crítica da economia política.

Tanto quanto o legado da dialética como instrumento de investigação das relações sociais econômicas, Engels também legou em seu Esboço de 1844 uma série de questões, ou problemas, em aberto que viriam a ser investigadas com maior detalhe posteriormente por Marx.

Impulsionado pela leitura do Esboço de 1844, Marx iniciou efetivamente sua investigação dos clássicos da economia política. Os primeiros resultados desta investigação hoje nos são acessíveis através da publicação póstuma dos Cadernos de Paris (1844) e dos Manuscritos econômicos-filosóficos (1844) (MARX, 2010, 2015)⁠.

A investigação marxiana sobre as relações capitalistas de produção prosseguiram através de obras tais como Miséria da filosofia (1847), Grundrisse (1857-1858), Contribuição à crítica da economia política (1859) e O capital (1867, 1885, 1894) (MARX, 2001, 2008a, 2013, 2014, 2017b, a)⁠.

Portanto, o Esboço de 1844 fora o ponto de partida de um longo e minucioso projeto de investigação no qual Engels iniciou e, de certa maneira, veio a concluir ao publicar a edição dos dois últimos volumes de O capital de Marx.

Referências bibliográficas

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SWEEZY, Paul M. “Dialectics and Metaphysics”. Four Lectures on Marxism. New York: Monthly Review Press, 1981. p. 11–25.

(MARX; ENGELS, 2007)⁠

*Comunicação apresentada no IX Congresso de História Econômica: 200 anos de Karl Marx (FFLCH-USP), São Paulo, 4-7 dez. 2018.

**Mestrando do Programa de Pós-Graduação em História Econômica da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da Universidade de São Paulo (FFLCH-USP), 2017--. Bolsista CAPES/CNPq.

1Os Anais Franco-Alemães (Deutsch-Französische Jahrbücher) fora revista editada em Paris pelos filósofos alemães Arnold Ruge (1802-1880) e Karl Marx (1818-1883). Os Anais Franco-Alemães tiveram vida curta, tendo sido publicada somente uma edição (fev. 1844). (MECW 3, 1975, p. 647)⁠

277. Londres, 13 abr. 1871. (MECW 44, 1989, p. 136)⁠

3Engels morou na Inglaterra entre novembro de 1842 até meados de 1844, fixando-se na cidade de Manchester, onde trabalhou na administração das fábricas têxteis da Ermen & Engels, empresa da qual seu pai, Friedrich Engels (1796-1860), era sócio. Além dos trabalhos administrativos na Ermen & Engels, Engels iniciou a leitura e o estudo dos economistas políticos clássicos, por exemplo, Adam Smith, David Ricardo, Jean-Baptiste Say, John Ramsay MacCulloch, James Mill, Thomas Malthus etc. Nesse mesmo período, Engels também atuou na política socialista e no movimento cartista, e realizou pesquisa de campo sobre a condição de trabalho e habitação dos operários das grandes cidades industriais inglesas. (ENGELS, 1981, 2010; HENDERSON, 1976)⁠

5Sobre o papel de Engels na introdução da perspectiva dialética no estudo da economia (como também em outras ciências), ler Engels (2015)⁠ e Sweezy (1981)⁠.

6Conforme formulação do próprio Engels, dialética trata-se do processo dinâmico, “isto é, do movimento, mudança, transformação e desenvolvimento constante” da realidade, e a forma teórica (método dialético) através da “qual se faz a tentativa de demonstrar o nexo interior existente nesse movimento e desenvolvimento” do objeto de investigação. (ENGELS, 2015, p. 52)⁠

7“Retrograde Zeichen der Zeit” (Telegraph für Deutschland, n. 26, fev. 1840). (MECW 2, 1975, p. 47–49; MEW 41, 1967, p. 27–29)⁠

8Vale neste momento apresentar um breve parêntesis na exposição da comunicação para tratar do materialismo mecanicista característico dos economistas políticos britânicos e franceses. Inspirados nas ciências naturais, particularmente na física newtoniana, os economistas políticos acima citados pretendiam transpor as leis do funcionamento da natureza (por exemplo, as leis do funcionamento dos corpos celestes) no estudo das relações econômicas das sociedades humanas. Contudo, as ciências naturais do período consideravam a natureza “não em seu movimento, mas em sua estagnação, não como elementos essencialmente mutáveis, mas como elementos sólidos, não em sua vida, mas em sua morte”. (ENGELS, 2015, p. 50)⁠ Ao realizar a transposição desta concepção materialista da natureza (mecânica e estática) para o estudo das sociedades humanas, estas foram examinadas como objetos isolados, estáveis, desprovidos de uma dinâmica histórica. Esta concepção materialista mecânica dominava o fundamento metodológico dos economistas políticos tanto quanto de seus pares, os filósofos iluministas franceses do século 18, salvo algumas exceções, por exemplo, em obras como O sobrinho de Rameau (Le neveu de Rameau, redigido: 1761-1762; revisado: 1773-1774) de Denis Diderot (1713-1784) e Discurso sobre a origem e os fundamentos da desigualdade entre os homens (Discours sur l’origine et les fondements de l’inégalité parmi les hommes, 1755) de Jean-Jacques Rousseau (1712-1778), nas quais a concepção moderna da dialética foram formuladas e expostas pela primeira vez. Esta concepção mecanicista do mundo somente seria efetivamente superada pelo filósofo alemão G. W. F. Hegel (1770-1831), através do qual a “compreensão de todo o mundo natural, histórico e espiritual” (ENGELS, 2015, p. 52)⁠ passou a ser apreendido como um processo dialético, portanto, histórico. (CARREIRO, 1975; DIDEROT, 2006; ENGELS, 2015; KONDER, 2004; NETTO; BRAZ, 2012; ROUSSEAU, 2005)⁠

9Sobre as diferenças fundamentais entre o pensamento dialético e o pensamento não dialético ler Engels (2015, p. 48–54)⁠ e Konder (2004)⁠.

10Assim como Engels, Marx adotou em seus primeiros estudos de economia política a dialética materialista e a teoria da alienação feuerbachianas como método de investigação. No “Prefácio” dos Manuscritos econômicos-filosóficos, Marx declarou que “a crítica da economia nacional {, ou economia política,} deve […] sua verdadeira fundamentação às descobertas de Feuerbach”, e referiu-se a obra deste último como “revolução teórica” (MARX, 2010, p. 20)⁠.

11Décadas mais tarde, Engels viria a desenvolver em A origem da família, da propriedade privada e do Estado (Der Ursprung der Familie, des Privateigenthums und des Staats, 1884) a relação entre a propriedade privada e as lutas de classes de forma mais aprofundada e a partir do método historiográfico. (ENGELS, 2012)⁠

12Cf. MARX; ENGELS, 2007, p. 547-548, nota 10.